sábado, 30 de abril de 2011

Os sabores de Lima, a gastronômica capital do Peru



Causa sushi roll do Bravo Restobar, em Lima / Foto: Luisa Valle
O prêmio Nobel de Literatura concedido ao escritor peruano Mario Vargas Llosa em 2010 foi apenas mais um indício de que o Peru está mesmo em alta. A fama, no entanto, não se restringe às letras, e tampouco tem alguma relação com Machu Picchu, Cuzco ou as Linhas de Nazca. Não que estes lugares não façam parte de um roteiro essencial numa visita ao país. Muito pelo contrário, não podem ficar de fora. Mas, aos poucos, Lima vem deixando de ser apenas uma escala para se tornar destino final de quem procura bons passeios, com direito a catacumbas e sítios arqueológicos, e, principalmente, ótimos lugares para se comer. Afinal, estão aqui alguns dos chefs que botaram a cidade no mapa gastronômico mundial, como Gastón Acurio, que vem exportando seus ceviches, causas, ajís e, claro, as batatas que fazem parte da culinária peruana. Inclusive para o Brasil, que deve ganhar em breve a segunda filial de um dos restaurantes do chef.




Mistura dá o sabor da gastronomia peruana
Os imigrantes italianos trouxeram o tomate e as massas; os chineses e os japoneses, o arroz e o shoyo, e os espanhóis, as galinhas e o limão. A mistura étnica não poderia ter resultado numa gastronomia mais interessante. Aliado à isso, a posição geográfica do Peru, que engloba 84 dos 114 ecossistemas existentes do planeta, garante os ingredientes mais diversos vindo do mar, do alto dos Andes e da selva amazônica, o que encanta o paladar de qualquer um com seus ceviches, causas e lomos.
Camarões com batatas e milho no La Mar, de Gastón Acúrio, em Lima / Foto: Luisa Valle
E, claro, nenhum lugar é melhor para provar a comida peruana do que Lima, que em 2006 foi declarada a capital gastronômica da América do Sul, durante o congresso internacional de gastronomia Madri Fusion. Não é à toa que a renomada Le Cordon Bleu escolheu o Peru para sediar a sua primeira filial no continente.
É na capital peruana que estão os restaurantes dos chefs mais famosos do país, como Gastón Acurio, um dos maiores responsáveis pelo boom da cozinha local pelo mundo. Acurio é sempre o primeiro nome que sai da boca dos peruanos quando o assunto é comida. E comer em uma de suas casas já faz parte do roteiro obrigatório.
Uma boa opção é o badalado Astrid e Gastón, que ele abriu em 1994 com sua mulher, também chef. Outra boa opção é a cevicheria La Mar, que em 2009 inaugurou uma filial em São Paulo. O prazer da refeição começa com os piqueos, ou entradinhas. Os chips de batata são viciantes. No charmoso bairro de Miraflores, a cevicheria tem um ambiente agradável, de fim de praia, que combina bastante com o menu, e vive cheia. Mas quem não come frutos do mar pode ir ao La Mar também. Apesar de o menu ser praticamente todo de peixes, existe um cardápio "underground" para quem não gosta de pescados ou "crianças rebeldes" que resistam à especialidade.
Espaguete servido com molho de mariscos, no La Mar, de Gastón Acúrio, em Lima / Foto: Luisa Valle
Outro restaurante com um clima de praia é o Rosa Nautica, também em Miraflores. A casa, que durante anos foi comandada pelo chef Alfredo Aramburú, serve frutos do mar. Mas o que chama atenção é a sua localização: fica num píer que avança sobre a praia. O Cala, esse sim atualmente comandado por Aramburú, que fica na região de Barranco, é outro com vista para o mar. O cardápio é uma mistura de culinária mediterrânea com a peruana.
A comida fusion, aliás, é forte nos restaurantes da cidade. O Bravo Restobar serve uma comida "para estrangeiro entender", como explica o chef e proprietário Christian Bravo. No elegante bairro de San Isidro, o moderno restaurante de Bravo oferece, entre outras coisas, o rolinho primavera de lomo e a causa sushi roll, mistura das gastronomias peruanas e orientais.
E as influências chinesas e japonesas são tão fortes na comida peruana que hoje existem milhares de restaurantes chifas no país. A expressão, usada para designar os restaurantes de comida chinesa e peruana, significa "coma arroz". Em Lima, entre as muitas opções, está o Wa Lok, no Centro.
Purê feito com ervilhas e salsichas do El Grifo, da chef Jana Escudero, em Lima / Foto: Luisa Valle
Mas, se você prefere uma refeição com um toque mais caseiro, vai gostar do El Grifo, da chef Jana Escudero. Suas receitas incluem um lomo saltado com arroz e batatas que em 2009 foi premiado no Mistura, feira gastronômica internacional realizada em Lima, e um medalhão de filé com purê feito com ervilhas e salsichas, e um ovo poché por cima. O visual é interessante, e o sabor, divino. Melhor ainda são as sobremesas, entre elas os bombones de Baileys, com três texturas diferentes e recheados de avelã e um toque da bebida. Outra campeã é o cheesecake de chocolate, batizado de cheesecake de toblerone.
Passeio histórico pelo centro de Lima
Os atrativos de Lima não param no ceviche e nos lomos. A cidade que, durante dois séculos, foi a capital dos domínios da Espanha na América do Sul, encanta com suas ruas largas e prédios com arquitetura que mistura o estilo espanhol e o colonial - embora um terremoto no século XVIII tenha destruído grande parte das construções originais. A profusão de pedestres e carros circulando é grande, como em qualquer outra metrópole, mas não impede um passeio agradável pelo Centro Histórico da antiga "Cidade dos Reis" - até para fazer a digestão.
A Catedral de Lima, na Plaza Mayor / Foto: Luisa Valle
A primeira parada é na Plaza Mayor, antiga Plaza de Las Armas, onde a cidade foi fundada por Francisco Pizarro. Ali estão a Catedral, o Palácio do Arcebispo, a prefeitura e o palácio do governo, cada um numa lateral da praça, com seus prédios amarelos e decoração de canteiros de flores.
A catedral, com suas torres gêmeas, chama a atenção dos visitantes. São cinco naves e dez capelas. Uma delas é a de São João Batista, onde está um entalhe com uma imagem de Jesus considerado um dos mais bonitos do continente. Dizem que, antigamente, a estátua de um homem num cavalo decorava a entrada da igreja, mas o bispo teria mandado removê-la, porque o, digamos assim, derrière do cavalo ficava voltado para o monumento. A estátua foi exilada numa outra praça menor e, mais tarde, teria sido removida novamente, por motivos desconhecidos. Atualmente, está desaparecida.
Durante os dias, a praça fica lotada de crianças e pedestres que aproveitam um dos banquinhos para admirar o grande chafariz que ocupa o centro da quadra, ou apenas ver a vida passar. Vale lembrar que, como em qualquer cidade grande, a atenção deve ser redobrada, na hora de parar para tirar fotografias.
Casa da Literatura Peruana: construída em antiga estação em Lima / Foto: Luisa Valle
Não muito longe dali, numa das ruas laterais, fica a Casa da Literatura Peruana, um espaço cultural onde as obras de alguns dos escritores mais famosos do país são celebradas em mostras. A visita vale principalmente pela arquitetura do prédio, construído na antiga estação central de trem Desamparados.
Logo adiante, fica o complexo de São Francisco, composto por uma igreja, um convento, duas capelas e a antiga catacumba pública. Infelizmente, não é permitido tirar fotos dentro do complexo. O pátio do convento é um dos pontos altos, decorado com azulejos de Sevilha. Parte do teto também é original, e todo construído com pedaços de madeira unidos por cravos. Os afrescos nas paredes chamam ainda mais atenção. Para economizar, as pinturas foram feitas em telas reaproveitadas, vindas da Espanha. Com o tempo, a tinta foi falhando e, hoje, grande parte dos quadros exibe pedaços das imagens originais.
Complexo de São Francisco, composto de um convento, uma igreja e catacumbas, em Lima / Foto: Luisa Valle
A parte mais interessante do passeio fica por conta das catacumbas e corredores estreitos no subterrâneo do complexo, tomados por ossadas. Dizem que existem mais de 70 mil delas, redescobertas no século XX. A maioria seria de pessoas pobres, e foram empilhadas e cobertas por cal.
De volta a superfície, o passeio continua pela Plaza San Martín, construída para comemorar os cem anos da independência do Peru, em 1921. No seu centro, fica a estátua do General José de San Martín, que proclamou a independência. Diferentemente da Plaza Mayor, sua arquitetura é francesa. É nela que está o Gran Hotel Bolivar e o Club Nacional, exclusivo para homens. Seguindo pela Jirón de la Unión, rua só de pedestres cheia de restaurantes e lojinhas, voltamos ao ponto de partida do roteiro, a Plaza Mayor.
Miraflores e San Isidro: a 'Zona Sul' da cidade
Vir a Lima e não passear pelos bairros de Miraflores e San Isidro é quase o mesmo que visitar o Rio e não andar pela Zona Sul da cidade. É aqui que estão concentrados os melhores e mais badalados restaurantes. Em Miraflores, por exemplo, um dos pontos de encontro de moradores e turistas é a Calle de las Pizzas, cheia de bares com mesas na calçada. À beira-mar, a região também guarda também alguns bons refúgios da cidade grande, como o Parque Kennedy, que no fim de semana ganha um mercado de artesanato, e seu anfiteatro vira uma pista de dança.
Vista do litoral de Miraflores, bairro nobre de Lima / Foto: Eduardo Maia
E como estamos falando de Peru, não poderia faltar uma monumento arqueológico. O Huaca Huallamarca, em San Isidro, é uma pirâmide construída entre 200 e 500 a.C., feita com tijolos de adobe e usada como ponto de ritual pelo povo hualla. Algumas múmias e artefatos encontrados por arqueólogos na região estão expostos no local. Outro monumento arqueológico é o Huaca Pucllana, uma espécie de centro administrativo criado por pescadores e agricultores nômades há mais de dez mil anos. Mais tarde, o sítio arqueológico acabou virando um cemitério e, depois, um local de oferendas.
RESTAURANTES
Astrid e Gastón: Calle Cantuarias 175, Miraflores. Tel. (511) 242-5387. www.astridygaston.com
La Mar: Av. La Mar 770, Miraflores. Tel. (511) 421-3365. lamarcebicheria.com
La Rosa Nautica: Espigón 4 Circuito de Playas, Miraflores. Tel. (511) 445-0149. www.larosanautica.com
Cala: Espigón B2 Cuadra 1, Costa Verde, Barranco. Tel. (511) 252-9187. www.calarestaurante.com
Bravo Restobar: Av. Conquistadores 1.005, San Isidro. Tel. (511) 221-5700. www.bravorestobar.com
El Grifo: Av. Colonial 2.703. Tel. (511) 564-7789.
PASSEIOS
Catacumbas da Igreja de São Francisco: O ingresso custa 7 novos soles (R$ 4,20). Plaza San Francisco. museocatacumbas.com
Casa da Literatura: Jr. Ancash 207. Tel. (511) 426-2573. www.casadelaliteratura.gob.pe

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