terça-feira, 22 de março de 2011

Arte ao redor da mesa nas cantinettas de Florença

FLORENÇA - Há duas maneiras certeiras e excludentes de se ficar atordoado na Toscana. Uma é sofrer a Síndrome de Stendhal, mal-estar que acomete quem é exposto ao excesso de beleza das obras do Renascimento em Florença, como a que atacou o escritor francês cujo nome batiza a sensação. Outra é pegar o caminho da roça e fazer o circuito de agroturismo pelas vinícolas - voltando com algumas garrafas na bagagem e alguns tragos na cabeça levemente despreocupada e grogue. Mas há uma terceira via, que combina algumas das marcas mais famosas da região central italiana com monumentos da Renascença: fazer o circuito das cantinettas das vinícolas Verrazzano, Antinori e Frescobaldi. Os bares que apresentam a variedade de sua produção ficam em um perímetro delimitado entre as Uffizzi e a Igreja de Santa Maria del Fiore. No meio delas, há um tour de compras e arte que pode ser entremeado com uma parada para almoço ou jantar degustando algumas das melhores marcas da Toscana.

Uma experiência histórica e gastronômica
Estátuas da Loggia dei Lanzi vistas do Palazzo Vecchio, em Florença: sugestão de passeio depois do jantar na Cantinetta Frescobaldi/Foto de Gustavo AlvesParar para comer entre uma visita às Uffizzi e a subida ao campanário de Giotto - programas obrigatórios em Florença - pode ser uma escolha menos óbvia do que indica a profusão de restaurantes e bares no Centro Histórico de Florença. Nem tanto pelo risco de cair em uma armadilha para turista - na Toscana, mesmo restaurantes que caem nesta classificação podem servir uma refeição satisfatória. Mas se você está na cidade tão importante para a pintura, a escultura, a arquitetura, a poesia e o pensamento político... vai cortar este clima pedindo uma pizza com coca-cola? Os monumentos perdem um pouco do gosto, depois de uma refeição destas. Nas cantinettas, gasta-se mais, mas nem tanto assim: o preço das refeições pode chegar perto dos 100 euros, mas dá para ser feliz gastando a metade ou mesmo 15 euros num jantar na Verrazzano com apenas uma taça de vinho - variedade significa também preços diferentes.
A sensação de manter o mergulho na História é garantida na Cantinetta Verrazzano. Dos três bares de vinícolas na área histórica de Florença, este é o menor: divide-se em duas salas onde há pequenas mesas de madeira com tampo de mármore, e armários também de madeira escura que abrigam garrafas da vinícola que começou a prensar uvas em 1170 - se formos levar em conta apenas o primeiro registro escrito sobre a Verrazzano.
Em volta, topa-se o tempo todo com a estampa de um homem barbudo metido numa armadura, nos rótulos das garrafas e em cartazes nas paredes. Ele é o orgulho náutico da família: Giovanni da Verrazzano, o navegador que descobriu Manhattan em 1524, e cujo nome batiza a ponte que liga a ilha mais importante de Nova York a Staten Island. Como os clientes nova-iorquinos são informados, quando sua origem é descoberta pelo garçom que serve a mesa, enquanto ele faz malabarismos com taças e garrafas que segura apenas pela base, sem deixar cair uma gota.
Cantinetta Antinori, em Florença: ingredientes no cardápio vêm das propriedades da família / Foto: DivulgaçãoUm ambiente menos familiar e mais formal espera quem entra na Cantinetta Antinori. Ela pode ser chamada até de estabelecimento caseiro, mas não no sentido ao qual se dá normalmente à palavra: fica no palácio do século XV que serve de residência para a nobre família Antinori. Chega-se aos seus dois salões mais amplos e com maior espaço entre as mesas por uma entrada à direita, logo depois da porta principal. Em cima, há um brasão da Corporação de Arte dos Vinhateiros, em que Giovanni di Piero Antinori, o primeiro integrante da família a produzir a bebida, inscreveu-se em 1385.
Lá dentro, não só os vinhos, mas o azeite vem das propriedades rurais da família, assim como ingredientes de seu menu, pequeno mas capaz de provocar dilemas - o que é melhor, o ragu com javali ou a salada de camarões com alcachofra? Depois de decidir e comer bem em qualquer um dos casos, desça pela direita e visite as lojas da Via dei Tuornabuoni, com Tiffany numa ponta, Ferragamo na outra, e Prada no meio.
Cantinetta Frescobaldi, perto da Piazza della Signoria: comida tradicionalPerto da Piazza da Signoria, está a Cantinetta Frescobaldi. Sua intimidade com o vinho vem de longe, desde o século XIV, e eles já tiveram como clientes o rei Henrique VIII da Inglaterra e Michelangelo. Mas o nome é mais lembrado atualmente pela sua associação com o americano Robert Mondavi na década passada. A globalização não chegou aos pratos da cantinetta: ela é especializada na culinária toscana tradicional, com pratos como ravióli de abóbora com manteiga e sálvia, tagliatelle com alcachofra e ossobuco de vitela. Reserve uma mesa para jantar, e depois, para fazer a digestão, contemple a visão noturna das estátuas em frente ao Palazzo Vecchio (lembre-se que aquele "David" é uma cópia do original de Michelangelo, que está na Galleria dell'Accademia) e da Loggia del Lanzi, como o "Perseu" esculpido por Cellini: você vai se encantar, mas abastecido do melhor da comida e do vinho toscano, já estará preparado para não sofrer com nenhuma Síndrome de Stendhal.
SERVIÇO
Cantinetta Verrazzano: Aberta de segunda-feira a sábado, entre 8h e 21h. Via dei Tavolin 18. Tel. 39 (055) 268-590. www.verrazzano.com
Cantinetta Antinori: De segunda a sexta-feira, das 12h às 14h30m e das 19h às 22h30m. Piazza Antinori 3. Tel. 39 (055) 292-234. www.cantinetta-antinori.com
Cantinetta Frescobaldi: Abre para almoço e jantar de terça-feira a sábado. Às segundas-feiras e domingos, somente para jantar. Via del Magazzini 2-4. Tel. 39 (055) 284-724. www.deifrescobaldi.it

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