sábado, 23 de junho de 2012

Nova York na pressão: um roteiro ao sabor da cevada




Com sete filiais na cidade, quase sempre junto a cartões-postais como o Empire State, a Heartland Brewery produz diversas variedades de cerveja, entre regulares e sazonais
Foto: Bruno Agostini / O Globo
Com sete filiais na cidade, quase sempre junto a cartões-postais como o Empire State, a Heartland Brewery produz diversas variedades de cerveja, entre regulares e sazonaisBRUNO AGOSTINI / O GLOBO
NOVA YORK- Em um glorioso jantar no restaurante Per Se, quando o sommelier se aproximou da mesa para sugerir uma bebida para acompanhar um prato de queijo, último ato antes das sobremesas, ele apresentou uma garrafa de cerveja da Brooklyn Brewery : "É uma edição especial, produzida perto daqui. Na minha opinião, uma boa cerveja, encorpada e aromática como essa, é melhor que qualquer vinho para se combinar com um prato de queijos variados", anunciou. Isso foi há cerca de quatro anos, quando começaram a surgir os primeiros sinais de que Nova York estava bastante interessada em recuperar as suas ancestrais raízes cervejeiras. Afinal, a cidade foi fundada por holandeses, depois passou para as mãos dos britânicos e acabou recebendo uma imensa quantidade de colonos irlandeses, todos esses notórios amantes de louras, ruivas e morenas. Dali em diante não pararam de surgir pequenas cervejarias, além de ótimos lugares para se apreciar a bebida, como a espetacular Birreria, um dos destaques do Eataly, complexo gastronômico dedicado à Itália. A última novidade é a exposição "Beer here", inaugurada no fim do mês passado na New York Historical Society. A essas novidades se juntam clássicos com a McSorley’s Old Ale House, inaugurada em 1854, desde então servindo ótimos chopes aos seus clientes, entre eles muitos e muitos turistas.
Dos clássicos ao ‘Renascimento’
Um belo balcão de madeira escura descascado pelo tempo parece estar ali desde 1854, ano de inauguração da McSorley’s Old Ale House, no sul de Manhattan, no East Village. Alguns clientes com pinta de assíduos ficam por ali mesmo, bebendo e conversando. As mesas e cadeiras também apresentam as marcas do tempo: devem ter a idade da casa, instalada em um daqueles prédios de tijolinhos que são a cara de Nova York, com direito a escada de incêndio na fachada. A decoração é lindamente caótica, misturando muitas fotos antigas em preto e branco e recortes de jornal enfeitando as paredes, cheias de penduricalhos, os mais diferentes, de relógios centenários a bandeirinhas da Irlanda, pátria de John McSorley, que chegou aos EUA em 1851 e fundou este endereço, fundamental para se desvendar a alma nova-iorquina. Um aquecedor de ferro domina o cenário. Espalhado pela chão, muito pó de serragem.
Parece que estamos em um filme de época. Há cem anos, em 1912, o pintor John French Sloan fez o quadro McSorley’s Bar: a obra mostra que o lugar nada mudou desde então. Bastariam esses elementos estéticos e históricos para fazer da visita ao lugar um dos programas mais imperdíveis de Nova York. Mas existem outros prazeres escondidos ali por detrás da fachada de vidro com madeira escura, onde repousam barris de madeira pintados de verde. Além da atmosfera há os comes e bebes, que são a alma de qualquer boteco que se preze. Para bebericar, as duas cervejas produzidas por eles e, para forrar o estômago, um corretíssimo fish’n’chips, ótima companhia para elas.
São duas variedades de cervejas, servidas na pressão, com espuma cremosa, ambas imperdíveis: a McSorley’s Ale (no estilo pale ale, com delicioso amargor) e a McSorley’s Black and Tan (no estilo stout, com sabor levemente adocicado e com aromas defumados). Para acompanhar, a pedida mais comum é mesmo o fish’n’chips, que honra a tradição britânica do lugar: trata-se de um belo filé de peixe com casquinha à milanesa crocante e carne de sabor delicado, servido com batatas fritas rústicas, de tamanho grande, acompanhado de rodelinha de limão siciliano. Para completar, canecas de vidro recheadas com um imperdível molho de mostarda de sabor intenso. Mas o quadro-negro que serve de cardápio ao lado do balcão lista outras comidinhas: podemos pedir sanduíches de presunto com queijo ou de peru, salada de camarão, tábua de queijos, hambúrguer com fritas e até uma sopa (clam chowder, é claro).
Dizem que este é o bar mais antigo dos Estados Unidos ainda em funcionamento. Até 1970 apenas homens podiam frequentar o lugar. Entre osclientes ilustres encontramos nomes como Abraham Lincoln, John Lennon e o o escritor e.e. cummings, que teria escrito ali o poema "I was sitting in McSorley’s".
Com sete pontos na cidade, a Heartland Brewery não tem tanta história para contar. Mas é uma peça chave nesse assunto: este foi um dos primeiros endereços a apontar para o renascimento da cultura cervejeira de Nova York. Em 1995 abriu as portas a primeira unidade, na Union Square. Hoje há filiais ao lado de pontos turísticos estratégicos, como o Empire State, o Radio City, Times Square e The Seaport.
São mais de 20 tipos de chopes no total, incluindo os de produção regular, servidos durante o ano inteiro, e os sazonais, feitos apenas em determinados períodos. Entre as que estão sempre jorrando das torneiras encontramos a Indiana Pale Ale, com aromas de especiarias e ótimo par para um bom salmão grelhado, e a Corn Husker Lager, indicada para acompanhar o ravióli de lagosta e caranguejo. Há versões saborizadas, como a famosa Smiling Pumpkin Ale, feita com abóbora e especiarias, como gengibre e canela, que é servida em setembro e outubro. No verão, entre junho e setembro, a casa serve a Summertime Apricot Ale, de trigo, aromatizada com damasco. O mestre cervejeiro Kelly Taylor não para de criar, e há sempre coisas novas a se provar. O que muda pouco é o menu, baseado em carnes, sanduíches e massas, com sugestões tipicamente americanas: o garçom sugere acertadamente as harmonizações com as cervejas da casa. Pode confiar. Um dos destaques vai para o suculento NY strip steak, servido com purê de batatas e molho feito com a Red Rooster Ale.
Outra marca importante que contribuiu decisivamente para o momento atual da cultura cervejeira em Nova York é a Brooklyn Brewery, inaugurada em 1996 com pompa e circunstância: o então prefeito Rudolph Giuliani cortou a faixa e foi o primeiro consumidor oficial da cerveja produzida ali. A marca se consolidou com um das principais dos Estados Unidos, com uma linha de ótimas cervejas e fãs em várias partes do mundo, inclusive no Brasil. Hoje a fábrica recebe grupos de turistas que aprendem o processo de produção da bebida em visitas guiadas que acontecem diariamente. Há uma grande linha de produtos, vendidos como suvenir: de camisas, bonés e canecas a livros e kits para se fazer a própria cerveja em casa.
Tanto burburinho em torno da cerveja deu origem a uma série de eventos, como a NY Craft Beer Week, que este ano deve chegar à sua quinta edição, em setembro; o NYC Craft Beer Festival e o Craft Beer & Food Festival, ambos em março.
Brooklyn Brewery: 79 North 11th Street, Brooklyn. Tel.  (718) 486-7422brooklynbrewery.com
Heartland Brewery: São sete endereços diferentes espalhados pela cidade. Veja no site heartlandbrewery.com.
McSorley’s Old Ale House: 15 East 7th Street. Tel.  (212) 474-9148mcsorleysnewyork.com

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